quinta-feira, 18 de setembro de 2008

LIVRO DAS REPÚBLICAS: PREFÁCIO


PREFÁCIO

Este livro é o verdadeiro retrato das repúblicas dos estudantes.
Nesta história insere-se o meu galhardão de fundador da República Formigueiro, uma casa onde se forjaram carateres de homens que se tornaram, até hoje, meus melhores amigos. Para isto, sobretudo, sempre serviram as Repúblicas.
O Engenheiro Pedro Rocha no seu livro Homens de Ouro Preto já se referia à República Bastilha hospedando Getúlio Vargas “um indiosinho pequenino, magrinho, sempre com um risinho indefinível a mascarar-lhe o pensamento”, récem-chegado na década de 90.
Em 21 de abril de abril de 1954 ao transferir para aqui simbolicamente, a Capital do Brasil, meses antes do seu suicídio, ouvi daquele Presidente da República palavras carinhosas sobre a “República Bastilha”. Recebi dele um autógrafo “com um abraço” coisa que, junto a foto daquele momento, guardo com muita emoção.
Esse convívio republicano de no mínimo 6 anos estimulava o aparecimento de vocações extra-curriculares. Na Formigueiro o Engenheiro Maestro Ubirajara Cabral criou o Coral de Ouro Preto que ganhou o título nacional do Jornal do Brasil de melhor coral de música popular nos anos 50 e até hoje não superado.
Nas serestas da República Sinagoga nasceu o Engenheiro Cantor João Bosco, hoje um expoente das paradas musicais. E dos “golos” de cachaça nas festinhas também se lamenta os descaminhos para o alcoolismo de alguns fracos.
Da minha Formigueiro são imensas as lembranças. O Pintor Alberto da Veiga Guignard, aos beijos com a cozinheira “comadre” Regina por quem sofreu inesperada e alcoolizada paixão.
A voz de prisão que eu recebi quando lecionava uma aula para minhas paraninfadas na Escola Normal por autoria comprovada do roubo do porco da Dona Tonica. Isto foi uma arbitrariedade porque os larápios eram da Pensão Vermelha. Havia se celebrado um “convênio” com a Formigueiro para a matança, banquete do suíno e devolução dos ossos a sua proprietária, que foram embrulhados, com fita de presente, em um jornal de assinatura com meu nome e endereço.
Juscelino Kubitschek escolheu um engenheiro da Escola de Minas, Israel Pinheiro, para construir Brasília em 4 anos. Veio a Ouro Preto, como Governador de Minas e ao visitar uma República, com Israel procurou o Presidente para manifestar-lhe seu desejo de ter este título!
É importantíssima na vida profissional, a função da República. Ali se revelam, inteiramente, as tendências humanas, o senso de responsabilidade, de tolerância ou agressividade, de organização e de lealdade, de garra, tão necessários ao perfil de um engenheiro. São centenas as equipes de sucesso nos grandes empreendimentos que foram formadas a partir desse conhecimento.
Um dos mais expressivos foi a construção de Brasília. Para as posições que não podiam falhar foram convocados os Engenheiros da Escola de Minas: Diretorias de Operações, Planejamento, Energia Elétrica, Saneamento, Estradas etc. Eram da confiança absoluta de Israel Pinheiro que realizou a obra do século, no Brasil, a saber colocar o homem certo no lugar certo.
As repúblicas sempre se constituíram como uma família mais verdadeira que a consangüínea. Isto porque cada um escolhe seu irmão. Não há o grupo familiar imposto e muitas vezes detestável. E se o escolhido não é o ideal você o substitui.
A comunidade assim formada convive durante anos e anos. E o mais rico nunca leva vantagem. Mas a dignidade de cada um é o que conta para nivelar a vida em comum.
É comum se ouvir de antigos alunos que quando as repúblicas possuíam cozinha própria e não havia o Restaurante Universitário, a convivência era maior entre os estudantes e a influência republicana na moldagem das personalidades era completa.
Em Ouro Preto não é importante saber em que ano você se formou mas em que República você morou. Não são seus colegas de bancos escolares seus grandes amigos mas seus companheiros de vida estudantil. Isto se constitui na mais expressiva experiência de vida que jamais tive.
É notável como estas casas, com mais de um século, mantém acima das leis, em perfeito regime anárquico, uma tradição e coerência. Todos mandam e ninguém obedece.
Que pessoas e entidades sigam o exemplo da Fundação Gorceix ajudando os estudantes carentes, a Escola de Minas e a Universidade, mantendo este modelo de vida, de solidariedade e liderança.
Liderança que permitiu a homens como Pandiá Calógeras, um civil, engenheiro, tornar-se o mais expressivo Ministro da Guerra do Brasil.
Os livros de visitas e registros das Repúblicas as de atas do Centro Acadêmico ou os depoimentos em tantos livros como os escritos por David Dequech, José Fiuza de Magalhães, Cassio Damazio são preciosidades históricas a serem preservadas.
Soma-se a tudo isto, agora, esta obra coordenada pelo escritor e pesquisador Otávio Luiz Machado Silva – um homem fiel a Ouro Preto e Mariana.
Muito me honra prefaciar este livro, porque em Ouro Preto é uma legenda. E disto muito necessita o Brasil.



KLEBER FARIAS PINTO
Engenheiro e ex-aluno da República Formigueiro

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